sábado, 19 de julho de 2014

Fragmentos - história da Agatha por Camila Bernardini




"..Debaixo de uma lua azul eu te vi. Logo você me levará. Em seus braços. È tarde para implorar. Ou cancelar, embora eu saiba que deva ser. O tempo de decisão. Que vem contra a minha vontade...”




                Agatha tinha muitas casas e esconderijos, mas na maior parte do tempo preferia ficar no seu casarão localizado no alto da Lapa, onde tinha conforto, luxo e acima de tudo lembranças, pedacinhos fragmentados de uma vida que tivera antes de se tornar imortal. Pela casa fotografias, cartas, discos e livros.  Todos os itens contavam um pouco de sua história e mesmo sendo um passado doloroso e um passado distante das condições de que vivia agora, gostava de guardar tudo... Aqueles objetos nostálgicos eram o mais próximo que ela poderia chegar de lembrar como era sua vida humana.
                Estava na sala, sentada em uma pequena poltrona de couro preto, na mão uma taça de cristal com o liquido vermelho e precioso, o elixir da vida.  Seu olhar distante, sua postura fria como sempre.  Sua mente vagava por muitos lugares e seus pensamentos a confundiam. Sempre que fechava seus olhos via a imagem da mulher que conhecera noites atrás. Ela era linda, sua pele alva, cabelos ruivos e olhos esverdeados. Com contraste com a pele alva, várias tatuagens marcavam seu corpo. E ela dançava como ninguém. Uma verdadeira deusa em forma humana. Assim que a vampira pousou os olhos nela, logo pensou em seduzir aquela dama e ser sua vítima. Mas algo a impediu, uma força maior fez com que ela se controlasse e não atacasse ninguém àquela noite e desde então não tinha saído mais do seu casarão. Se alimentado apenas com o sangue que seu criado trazia diariamente.  Não era tão prazeroso como o sangue vermelho e quente misturado com o medo de suas vítimas, mas por alguns dias foi o suficiente. Em devaneios mal notou quando seu criado entrou na sala:
                -Senhora?
                -Como ousa me incomodar?
                - Eu só pensei que talvez essa noite a senhora quisesse sair, estou preocupado, há dias não se alimenta direito.
                - E desde quando isso é da sua conta?
                Agatha levantou do sofá de forma tão ágil, atirando a taça que estava em mãos na parede próxima, aonde os pedacinhos de cristal iam se estilhaçando. Pegou seu criado pelo pescoço e o arremessou contra a parede.
                -Meus criados não falam apenas me obedecem. Da próxima vez eu te mato sem pensar duas vezes seu verme.  E agora limpe toda essa bagunça.
                -Sim senhora...
                A vampira olhou pela sua janela, e deixou seus olhos vagarem pela noite e ir de encontro ao céu. Céu esse que devido a sua maldição segundo as lendas, seria renegada. As estrelas e a lua brilhavam com intensidade. O brilho azul da lua, o clarão das estrelas e a brisa fria fizeram com que ela fechasse os olhos por um instante. Se ainda fosse viva, se ainda fosse humana naquele momento teria soltado um longo suspiro.  Mas já não podia respirar, há muito tempo emoções tolas não a invadiam. E tudo o mais era deixado para trás somente para que ela pudesse saciar sua fome. Seu real e intenso prazer era perfurar a jugular e drenar o sangue, drenar toda a vida de um corpo. Era seu orgasmo, seu ápice. Viveria milhões de anos, mas sempre solitária. Afinal todos morriam, todos envelheciam, tinham sua própria família. Mas ela não. Ela fora roubada e tudo isso. E aos dezenove anos perdeu toda a chance de uma vida normal.
                Nunca esqueceria a noite que tinha se transformado em vampira. Era uma noite comum como tantas outras. Estava fazendo sua caminhada noturna, gostava de caminhar e correr para relaxar.  E gostava de fazer isso à noite, quando a cidade estava mais silenciosa e quando o mundo pertencia a ela. O silêncio, correr, respirar o ar da noite, e a lua, ah a lua, principalmente nas suas noites mais esplendorosas tinham o poder de acalmá-la e relaxá-la como nunca.  Quando parava de correr e voltava a caminhar em passos lentos, sua mente sempre já estava vazia. Somente a sensação de paz e bem estar a invadiam. E em uma dessas noites, quando terminou seus exercícios e voltava para casa, não notou que um homem estranho há seguia. Foi notar somente quando já no portão da sua casa, o homem por trás encostou um revólver na sua cabeça e com a voz baixa e rouca disse:
                -Venha comigo!
                Agatha estremeceu, mas o medo da morte e de levar um tiro fizeram com que ela não tivesse nenhuma reação que pudesse assustar o homem e ele optasse por matá-la ali mesmo. Ele a conduziu para uma viela escura e vazia, e ainda apontando a arma para ela, empurrou-a na parede e com sua mão livre começou a acariciar seus seios e logo passar sua mão por entre as pernas dela. Entendendo o que estava acontecendo, Agatha começou a chorar, iria ser estuprada por aquele homem imbecil e nojento.  Começou a chorar e em soluços pediu para que ele a deixasse em paz.  O homem apenas gargalhou e começou a rasgar as roupas da própria garota. Sem se importar com soluços, com o corpo que tremia a sua frente.  Como um animal implacável atacava o corpo da garota e a mesma só chorava. 
                Ela fechou os olhos e implorou para que aquilo acabasse rápido, estava com nojo dela mesma por não conseguir impedir aquele homem de violentá-la.  Foi então que nessa maré de angústia sentiu quando o homem foi arremessado longe.  Ele havia caído alguns metros de distância dela. E sua frente uma mulher. A mulher era tão linda que parecia um anjo, seu tom de pele, mais pálido que o normal, seus cabelos loiros e encaracolados.  Aquela mulher misteriosa em um segundo estava a sua frente, no outro estava ao lado do homem caído ao chão. Agatha gritou de terror, quando viu o anjo loiro cravar os dentes naquele homem e como uma vampira sugar todo o sangue dele. Como uma vampira, sim, isso só poda ser um pesadelo. Nada daquilo podia estar de fato acontecendo com ela.  Sua visão escureceu e nada mais viu.  Quando acordou e abriu seus olhos viu que estava deitada em uma cama desconhecida e em um lugar desconhecido. Acariciando seu rosto e seus cabelos, estava àquela mesma mulher que há tinha salvado. Então não tinha sido um pesadelo? Queria pensar um pouco mais em tudo aquilo, mas as carícias daquela mulher estavam cada vez mais intensas e ela começou a se excitar. Agatha ficou com a respiração entrecortada, quando a mulher loira a sua frente deslizou suas mãos por entre as coxas dela, brincando um pouco mais, antes de subir a mão para sua virilha e seu sexo. O anjo loiro acariciou cada parte do seu corpo, e quando percebeu que Agatha estava completamente excitada, gemendo baixinho, deu seu beijo final e de morte, encravando seus dentes no pescoço da garota. E por alguns minutos eternos drenou todo o sangue que podia toda a vida que podia. Logo em seguida com sua própria unha fez um corte em seu seio esquerdo e deu para que a Agatha tomasse. Tudo depois disso são lembranças confusas, noites estranhas, de delírios, corpo queimando e ardendo, sentidos aguçados, a claridade e o sol foram perdendo o sentindo. Até não existir mais para ela. Talvez nesse período pudesse ter sido passado apenas alguns dias, meses, semanas. O fato é que Agatha não se recordava de quanto tempo levou até que toda a dor e o delírio chegassem ao fim. Lembrava apenas de uma noite ter aberto os olhos e enxergado o mundo de outra forma. Descobriu aquela noite que seu anjo loiro era uma vampira que seu nome era Daniele e que essa vampira tentava proteger as mulheres que encontravam das maldades que os homens praticavam com elas. Agatha então descobriu como os homens eram nojentos e patéticos, e toda vez que se lembrava da forma como aquele homem estranho tinha a violentado, sentia uma raiva gigante por homens. E decidido então que iria utilizar da própria fraqueza delas uma arma: o sexo. E acabaria com quantos homens pudesse. Nessa vida solitária se ser uma vampira.·.
                Agatha abriu seus olhos e mais uma vez se encontrava no presente e na sua sala. O criado já havia limpado a sujeira e os vidros quebrados da taça e inclusive se retirado do recinto. Ela voltou a sentar no seu sofá, e esfregou suas mãos na cabeça. Quando se tornou vampira jurou matar quantos homens pudesse, atraindo eles para sua morte com o sexo. Sexo que sempre os enlouquecia. Mas de umas noites para cá se questionava se todos os homens mereciam mesmo morrer, se todos eram cruéis.
                -Mas claro que é minha cara.
                A vampira reconheceu a voz imediatamente.
                -Como pode saber Daniele?
                -Você já conheceu algum homem puro?
                Agatha não respondeu, mas essa pergunta à fez lembrar o rosto que de fato a estava atormentado. O rosto que de fato estava trazendo tantas lembranças e questionamentos na sua vida de uns tempos para cá. Com fúria descontrolada foi até a cristaleira que guardava louças antigas de sua família antes de tudo e a atirou de uma vez no chão. Louças quebradas, tudo estilhaçado pelo chão. Daniele olhou para ela surpresa, mas nada disse.  Agatha contornou todas as coisas quebradas e sentou em um canto do chão. Chorou por alguns instantes, lágrimas de sangue caiam sobre seu rosto.  Queria que esse tormento acabasse, queria tiraras imagens daquele garoto de sua mente e principalmente se recusava a acreditar que depois de tanto tempo poderia ter uma emoção humana e ainda que tivesse sido desperta por um simples menino.  Aquilo teria que acabar.

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